É bonito ter Amigos que não morrem!
Conheci o Zeca, de quem me tornei amigo de peito, em finais dos anos 60, em Paris, onde vivi uns anitos, graças ao inconfundível espírito europeísta/hitleriano, e nunca orgulhosamente só, do rabugento e santificado ditador Salazar.
Com o Zeca partilhei algumas inesquecíveis e enriquecedoras viagens na vida com enorme prazer, determinação e muita disponibilidade e entrega. O Zeca era assim. Nunca parava. O seu espírito, a sua poesia, a sua música e o seu exemplo são intemporais, universais e não se podem catalogar. Zeca foi, é e será um exemplo em qualquer lugar e em qualquer tempo deste mundo e continua a fazer parte da vida. O seu espírito, a sua poesia, a sua música e o seu exemplo são intemporais e universais. É uma saudável característica da eternidade dos grandes artistas.
Zeca Afonso foi perseguido, expulso da carreira docente, maltratado e preso pela desprezível, estuporada e hitleriana ditadura salazarenta, mas nuca desistiu, por que …era um inquebrantável defensor da “terra da fraternidade”, do “traz outro amigo” e da “cidade sem muros nem ameias…” e não só! Após o 25 de Abril/74, o Zeca já não se pertence e não tem mãos, nem pés, a medir para percorrer o Portugal que despertou para a Liberdade, tantas eram as solicitações que lhe eram dirigidas. Era espantoso e belo!
O Zeca tinha a música no sangue, o desejo da felicidade da humanidade no coração, o génio e a conquista da utopia na cabeça e a genica no corpo. Era um desassossegado contagioso com alguma boa malícia e humor sarcástico à mistura, e, como ele dizia: “Ó malta, isto já lá não vai só com cantigas”, e teve razão como se verificou no 25 de Abri de 74.
O Zeca era um homem bom e de coragem e de afectos, e, também, terno, solidário e falava sempre da esperança. A sua música, a sua postura e a sua vivência activa eram a síntese do seu desassossego e tornavam-se numa arma que metia, e ainda mete, medo a muita gente vampiresca, salazarenta e saudosista, e davam, e ainda dá, coragem a muita mais.
A amizade, a lealdade, a determinação, a solidariedade e a terra da fraternidade eram Ele. Foi um grande homem de acção cívica. Era um vulcão em constante erupção que espalhava lavas de solidariedade, de candura e de boa revolta, de vontades, de prazer de viver e da utopia e criava à sua volta como que uma ilha de afectos.
Pois é, Zeca, pregaste-nos uma partida ao teres partido tão cedo, com 58 anos, apesar de continuares carinhosamente entre nós, por que, como dizia J.P. Sartre “estar morto é ficar entregue aos vivos”. A vida não pára, nosso bom e querido Amigo, e às vezes sabe bem sermos beliscados pele memória e a Zecafonia faz bem! Margarite Yourcenar disse: “A memória da maior parte dos homens é um cemitério abandonado, onde jazem, sem honras, mortos que eles deixaram de amar”, o que não acontece com o Zeca, por que ele é o passado sempre presente, vigoroso e actual. A memória, às vezes, torna-se viva e ajuda-nos a reinventar a vida e a preparar o futuro, por que, como alguém disse, as vitórias do esquecimento são sempre derrotas da liberdade.
Lembrar-te e ouvir-te, Zeca, continua a tornar-nos “ filhos da madrugada”. Que bonito!
Por isso, meu enorme amigo, é imperiosos reviver as tuas andanças com emoção e saudade para que a memória se não apague, por que, como disse um amigo comum, só morreu o corpo do Zeca.
José Casimiro Ribeiro (Guimarães)
O meu querido José Casimiro.
Tantos anos sem saber novas do meu amigo e agora bate-me nas ventas com este texto tão bonito.
A ver se nos encontramos por aí, e até lá um grande abraço.
Adorei, não convivi com o “nosso” Zeca pessoalmente, mas sou sua fã desde os fados de Coimbra. Escuto avidamente tudo os que de perto lidaram com ele. Grata pela partilha.
O grande Casimiro a falar do grande Zeca, de quem só morreu o corpo…
E o que fala, fá-lo bem e com propriedade.
É verdade que já não nos vemos há séculos…
Que é feito de ti? Espero que bem!
Grande abraço
Meu querido professor em Lourenço Marques, em 1965, andava eu no 5.º ano do Liceu António Enes… Quando a minha timidez e ansiedade me deixavam à procura de mim, sem a nada me integrar.
Foi ele que, indiretamente me abriu os olhos e levou a ser quem hoje sou.
Ele mostrou-me/nos uma realidade que nos era sonegada, apresentou autores, abriu o pensamento. E lecionava a cadeira de geografia…
No exame final acudiu-me, quando a timidez e o nervoso miudinho me bloquearam a mente…
Querido professor. Que saudades.
Vale-me ouvi-lo de vez em quando nas músicas que criou e interpretou com alma e harmonia. Incontornáveis na história da música portuguesa e inesquecíveis a quantos o apreciam em todas as suas valências.
Um abraço amigo, Zé Casimiro. Da Turma Lhomond, Paris, em 1970?